CONSTITUIÇÃO PROVISÓRIA DO ESPIRITISMO

I Considerações Preliminares

O espiritismo teve, como todas as coisas, seu período de nascimento, e até que todas as questões, principais e acessórias, que a ele se ligam, tivessem sido resolvidas, ele só pode dar resultados incompletos; pode-se entrever o seu objetivo, presumir-lhe as conseqüências, mas apenas de maneira vaga.

Da incerteza sobre os pontos ainda não determinados forçosamente deveriam nascer divergências sobre a maneira de os considerar; a unificação só poderia ser obra do tempo; ela se fez gradualmente, à medida que os princípios foram elucidados. Somente quando a doutrina tiver abraçado todas as partes que comporta é que formará um todo harmonioso, e só então é que se poderá julgar o que é verdadeiramente o Espiritismo.

Enquanto o Espiritismo não era mais que uma opinião filosófica, não podia haver entre os adeptos senão a simpatia natural produzida pela comunidade das idéias, mas nenhum laço sério podia existir, por falta de um programa claramente definido. Tal é, evidentemente, a principal causa da pouca coesão e estabilidade dos grupos e sociedades que se formarem.

Assim, constantemente e com todas as nossas forças, dissuadimos os Espíritas de fundar prematuramente qualquer instituição especial apoiada na doutrina, antes que esta estivesse assentada em bases sólidas; teria sido expor-se a revezes inevitáveis, cujo efeito teria sido desastroso, pela impressão que teriam produzido sobre o público e pelo desencorajamento disto resultante nos adeptos. Esses revezes talvez tivessem retardado de um século o progresso definitivo da doutrina, a cuja impot6encia teriam imputado um insucesso que, na realidade, não teria sido senão resultado da imprevidência. Por não saber esperar para chegar ao ponto, os muito apressados e os impacientes em todos os tempos comprometeram. As melhores causas (1).

Não se deve pedir às coisas senão o que elas podem dar, à medida que estejam em estado de produzir; não se pode exigir de uma criança o que se deve esperar de um adulto, nem de uma árvore recentemente plantada o que só produzirá quando estiver em toda a sua força.

O Espiritismo, em via de elaboração, não podia dar senão resultados individuais; os resultados coletivos e gerais serão os frutos do Espiritismo completo, que se desenvolverá sucessivamente.

Posto que o Espiritismo ainda não tenha dito sua última palavra sobre todos os pontos, aproxima-se de seu complemento e não está longe o momento em que será preciso dar-lhe uma base forte e durável, não obstante susceptível de receber todos os desenvolvimentos que circunstâncias ulteriores comportarem, e dando toda segurança aos que indagam que lhe tomará as rédeas depois de nós.

A doutrina é, sem dúvida, imperecível, porque repousa sobre as leis da natureza e que, melhor que qualquer outra, responde às legítimas aspirações dos homens; entretanto sua difusão e sua instalação definitiva podem ser adiantadas ou retardadas por circunstâncias, algumas das quais estão subordinadas à marcha geral das coisas, mas outras são inerentes à própria doutrina, à sua constituição e à sua organização; é destas que temos que nos ocupar especialmente no momento.

Posto que a questão de fundo em tudo seja preponderante e acabe sempre por prevalecer, a questão de forma tem aqui uma importância capital; ela poderia mesmo ultrapassá-la momentaneamente a suscitar entraves e demoras, conforme a maneira por que for resolvida.

Teríamos, pois, feito uma coisa incompleta e deixado grandes embaraços para o futuro, se não tivéssemos previsto as dificuldades que possam surgir. Foi em vista de o evitar que, com o concurso dos bons Espíritos que nos assistem em nossos trabalhos que elaboramos um plano de organização, para o qual tiramos proveito da experiência do passado, a fim de evitar os escolhos, contra os quais se chocaram, em maioria, as doutrinas que apareceram no mundo. Podendo este plano prestar-se a todos os desenvolvimentos que reserva o futuro, demos a esta constituição a qualificação de transitória.

O plano que segue foi concebido há muito tempo, porque sempre nos preocupamos com o futuro do Espiritismo; fizemo-lo pressentir em diversas circunstâncias, vagamente, é certo, mas suficientemente para mostrar que não é hoje uma concepção nova, e que, trabalhando na parte teórica da obra, não neglicenciávamos o lado prático.

Antes de abordar o fundo da questão, parece-nos útil lembrar algumas passagens do relatório que apresentamos à Sociedade de Paris, a 5 de maio de 1865, a propósito da caixa do Espiritismo, e que foi publicado na Revista de junho de 1865. As considerações que ele encerra se ligam diretamente ao nosso assunto, do qual elas são as preliminares indispensáveis.

II Extrato do relatório da caixa do Espiritismo feito à Sociedade de Paris, a 5 de maio de 1865.

Falaram muito dos produtos que tirava de minhas obras; ninguém sério acredita realmente em meus milhões, mau grado a afirmação dos que dizem saber de boa fonte que eu tinha em trem de vida principesco, equipagens de quatro cavalos e que em minha caso só se pisava em tapetes de Aubusson. (Revista de junho de 1862).

A despeito do que tinha dito, além disso, o autor de uma brochura que conheceis, e que prova, por cálculos hiperbólicos, que o meu orçamento das receitas ultrapassa a lista civil do mais poderoso soberano da Europa, porque, já na França, vinte milhões de Espíritas são meus tributários (Revista de junho de 1863), ninguém jamais me deu nada, para mim pessoalmente; numa palavra, não vivo às custas de ninguém, pois que, das somas que me foram voluntariamente confiadas no interesse do Espiritismo, nenhuma parcela foi distraída em meu proveito (2).

Minhas imensas riquezas provem, pois, de minhas obras espíritas. Posto que estas obras tenham tido um sucesso inesperado, basta ser algo iniciado em negócios de livraria, para saber que não é com livros filosóficos que se amontoam milhões em cinco ou seis anos, quando se tem sobre a venda o direito de autor de apenas alguns cêntimos por exemplar.

Mas, muito ou pouco, sendo esse produto o fruto de meu trabalho, ninguém tem o direito de se imiscuir no emprego que dele faço. Ainda mesmo que se elevasse a milhões, do momento que a venda dos livros, assim como a assinatura da Revista, é facultativo e não é imposto em qualquer circunstância, nem mesmo para assistir às sessões da Sociedade, ninguém tem nada com isto. Comercialmente falando, estou na posição de todo homem que colhe o fruto de seu trabalho; corro a chance de todo escritor que pode vencer, como pode fracassar (3).

Posto que, a respeito, não tenha contas a prestar, creio útil, para a causa mesma a que me votei, dar algumas explicações.

Para começar, direi que não sendo as minha obras minha propriedade exclusiva, sou obrigado a comprá-las ao meu editor e as pagar como um livreiro, com exceção da Revista; que o lucro se acha singularmente diminuído pelos "sem valor" e pelas distribuições gratuitas, feitas no interesse da doutrina, a pessoas que, sem isto, seriam obrigadas a deles se privar.

Um cálculo muito fácil prova que o preço de dez volumes perdidos ou dados, que não deixo de pagar, basta para absorver o lucro de cem volumes. Isto seja dito a guisa de informação e entre parênteses. Tudo somado e feito o balanço, contudo resta alguma coisa. Imaginai a cifra que quiserdes. Que é que faço com ela? É o que mais preocupa certas criaturas.

Quem quer que outrora tenha visto o nosso interior e o veja hoje, pode atestar que nada mudou em nossa maneira de viver, desde que me ocupo do Espiritismo; ela é agora tão simples quanto o era outrora. Então é certo que os meus lucros, por enormes que sejam, não servem para nos dar os prazeres do luxo.

Será que eu tinha a mania de entesourar para ter o prazer de contemplar meu dinheiro? Não penso que o meu caráter e os meus hábitos jamais tenham podido faze-lo supor. Que se passa, então? Desde que isto não me aproveita, quanto mais fabulosa a soma, mais embaraçosa a resposta. Um dia saberão a cifra exata, assim como o emprego detalhado, e os fazedores de histórias terão para os seus gastos de imaginação. Hoje limito-me a alguns dados gerais, para por um freio em suposições ridículas. Para tanto, devo entrar nalguns detalhes íntimos, pelo que vos peço perdão, mas que são necessários.

Em todos os tempos temos tido de viver, muito modestamente, é certo; mas o que teria sido pouco para certa gente nos bastava, graças aos nosso gostos e aos nossos hábitos de ordem e de economia. À nossa pequena renda vinha juntar-se o produto das obras que publiquei antes do Espiritismo, e o do modesto emprego que tive de deixar quando os trabalhos da doutrina absorverem todo o meu tempo.

Tirando-me da obscuridade, o Espiritismo veio lançar-me numa nova via; em pouco tempo vi-me arrastado num movimento que estava longe de prever. Quando concebi a idéia do Livro dos Espíritos, minha intenção, era não me por em evidência e ficar incógnito; mas, logo ultrapassado, isto me foi impossível; tive que renunciar aos meus gostos de retiro, sob pena de abdicar a obra empreendida e que crescia dia a dia.

Foi-me preciso seguir o seu impulso e tomar-lhe as rédeas. Se meu nome tem agora alguma popularidade, não fui eu, certamente, que a busquei, pois é notório que nem a devo à propaganda, nem à camaradagem da imprensa, e que jamais me aproveite de minha posição e de minhas relações para me lançar na sociedade, quando isto teria sido fácil. Mas, à medida que a obra crescia, um horizonte mais vasto se desenrolava à minha frente, recuando os seus limites. Compreendi então a imensidade de minha tarefa e a importância do trabalho que me restava a fazer para a completar.

Longe de me apavorar, as dificuldades e os obstáculos redobraram a minha energia; vi o objetivo, e resolvi atingi-lo com a assistência dos bons Espíritos. Sentia que não tinha tempo a perder e não o perdi em visitas inúteis, nem em cerimônias ociosas. Foi a obra de minha vida; a ela dei todo o meu tempo, sacrifiquei o meu repouso, a minha saúde, porque o futuro estava escrito diante de mim em caracteres irrecusáveis.

Sem nos afastarmos do nosso gênero de vida, esta posição excepcional nem por isso deixou de criar necessidades às quais meus únicos recursos não permitiam ocorrer. Seria difícil imaginar a multiplicidade de gastos que ela determina, e que sem isto eu teria evitado.

Ora! Senhores, o que me permitiu esse suplemento de recursos foi o produto de minhas obras. Digo-o com felicidade, é com o meu próprio trabalho, com o fruto de minha vigílias que tenho provido, pelo menos na maior parte, as necessidades materiais da instalação da doutrina. Trouxe, assim, uma grande quota-parte à caixa do Espiritismo.

Os que ajudam a propagação das obras não poderão, assim, dizer que trabalham para me enriquecer, pois que o produto de todo livro comprado, de toda assinatura da Revista aproveita à doutrina e não a um indivíduo. Não era prover tudo no momento; também era preciso pensar no futuro e preparar uma fundação que, depois de mim, pudesse ajudar aquele que me substituirá na grande tarefa que terá de executar. Essa fundação, sobre a qual me devo calar ainda, se liga à propriedade que possuo, e é em vista disso que eu aplico uma parte de meus produtos em melhorá-la.

Como estou longe dos milhões com que me gratificaram, duvido muito que, a despeito de minhas economias, meus recursos pessoais jamais me permitiram dar a essa fundação o complemento que lhe queria ver me minha vida; mas, desde que sua realização está nas vistas de meus guias espirituais, se eu mesmo não o fizer, é provável que um dia ou outro, isto seja feito. Esperando, elaboro os seus planos.

Longe de mim, senhores, o pensamento de tirar a menor vaidade do que vos acabo de expor; foi preciso a perseverança de certas diatribes para me levar, posto que com pesar, a romper o silencio sobre alguns fatos que me concernem.

Mais tarde, todos aqueles que a malevolência houve por bem desnaturar, serão trazidos à luz por documentos autênticos; mas o momento dessas explicações ainda não chegou; a única coisa que me importava no momento era que ficásseis edificados sobre o destino dos fundos que a Providência fez passar por minhas mãos, fosse qual fosse a origem. Não me considero senão depositário, mesmo daqueles que ganho e, com mais forte razão, dos que me são confiados.

Alguém me perguntava um dia, sem curiosidade, bem entendido, e por puro interesse pela causa, o que eu faria de um milhão, se o tivesse. Respondi que o emprego seria completamente diferente do que teria sido feito no princípio.

Outrora eu teria feito propaganda por uma larga publicidade; agora reconheço que teria sido inútil, pois os nossos adversários disto se encarregaram à sua custa. Não pondo, então, grandes recursos à minha disposição para este objetivo, os Espíritos quiseram provar que o Espiritismo devia seu sucesso à sua própria força.

Hoje que o horizonte se alargou, que sobretudo o futuro se desdobrou, necessidades de uma outra ordem se fazem sentir. Um capital como o que supondes, teria um emprego mais útil. Sem entrar em detalhes que seriam prematuros, direi apenas que uma parte serviria para converter minha propriedade numa casa especial de retiro espírita cujos habitantes colheriam os benefícios de nossa doutrina moral; a outra para constituir uma renda inalienável, destinada:

1º - À manutenção do estabelecimento;

2º - A assegurar uma existência independente aquele que me suceder e aos que o ajudarem em sua missão;

3º - A atender às necessidades correntes do Espiritismo, sem correr o risco de produtos eventuais, como sou obrigado a fazer, desde que a maior parte de seus recursos repousa em meu trabalho que terá um termo.

Eis o que eu faria. Mas se esta satisfação não me é dada, sei que, de uma maneira ou de outra, os Espíritos que dirigem o movimento proverão a todas as necessidades em tempo útil. Eis porque absolutamente não me inquieto com isto, e me ocupo com o que é para mim a coisa essencial: o término dos trabalhos que me restam a concluir. Feito isto, partirei quando a Deus aprouver chamar-me.

III Dos Cismas

Uma questão que se apresenta logo de saída ao pensamento é a dos cismas que poderão nascer no seio da doutrina. O Espiritismo deles será preservado?

Certamente, não; porque terá, sobretudo no começo, que lutar contra as idéias pessoais, sempre absolutas, tenazes, lentas a se ligar às idéias de outrem, e contra a ambição dos que, a despeito de tudo, querem ligar seu nome a uma inovação qualquer; que criam novidades unicamente para poder dizer que não pensam e não fazem como os outros; ou porque o seu amor próprio sofre por só ocuparem um lugar secundário; ou, enfim, que vêem com despeito um outro fazer o que não fizeram e, além disso triunfar.

Mas como lhes temos dito centena de vezes: "Quem vos barra o caminho? Quem vos impede de trabalho pelo vosso lado? Quem vos proíbe de publicar as vossas obras? A publicidade vos está aberta como a todo o mundo; daí qualquer coisa de melhor do que o que está, ninguém a isto se opõe; sede mais apreciados pelo público, e ele vos dará a preferência."

Se o Espiritismo não pode escapar às fraquezas humanas, com as quais sempre se há de contar, pode paralisar as suas conseqüências, e é o essencial.

É de notar que os numerosos sistemas divergentes, surgidos na origem do Espiritismo, sobre a maneira de explicar os fatos, desapareceram à medida que a doutrina se completava pela observação e por uma teoria racional; é difícil que hoje esses primeiros sistemas ainda encontrem alguns raros partidários.

Aí está um fato notório, do qual se pode concluir que as últimas diverg6encias apagar-se-ão com a completa elucidação de todas as partes da doutrina; mas haverá sempre os dissidentes de idéias preconcebidas, interessados, por uma causa ou por outra, em fazer grupo à parte: é contra sua pretensão que é necessário presumir-se.

Para assegurar a unidade no futuro, uma condição é indispensável: é que todas as partes do conjunto da doutrina estejam determinadas com precisão e clareza, sem nada deixar no vago; para isto procedemos de maneira que os nosso escritos não possam dar lugar a nenhuma interpretação contraditória, e procuraremos que seja sempre assim.

Quando tiver dito claramente e sem ambigüidade que dois e dois são quatro, ninguém poderá pretender que se quis dizer de dois e dois são cinco. Poderão, pois, ao lado da doutrina formar-se seitas que não lhe adotem os princípios, ou todos os princípios, mas não na doutrina por interpretação do texto, como se formaram, tão numerosas, sobre o sentido das palavras mesmas do Evangelho. Aí está o primeiro ponto, de uma importância capital.

O segundo ponto é não sair do círculo das idéias práticas. Se é certo que a utopia de ontem seja, muitas vezes, a verdade de amanhã, deixemos ao amanhã o trabalho de realizar a utopia de ontem; mas não embaracemos a doutrina com princípios considerados como quimeras e que fariam que os homens positivos a rejeitassem.

O terceiro ponto, enfim, é inerente ao caráter essencialmente progressivo da doutrina. Porque ela não se embala em sonhos irrealizáveis para o presente, não se segue que ela se imobilize no presente. Exclusivamente apoiada nas leis da natureza, ela não pode variar mais que estas leis; mas se uma nova lei for descoberta, deve a ela ligar-se; não deve fechar a porta a nenhum progresso, sob pena de suicidar-se; assimilando todas as idéias reconhecidas justas, sejam de que ordem forem, físicas ou metafísicas, jamais será ultrapassada e aí está uma das principais garantias de sua perpetuidade.

Se, pois, uma seita se formar ao seu lado, baseada ou não nos princípios do Espiritismo, acontecerá de duas uma: ou essa seita estará com a verdade, ou não estará; se não estiver, cairá por si mesma, sob o ascendente da razão e do senso comum, como tantas outras já caíram, desde séculos; se as idéias forem justas, ainda que só sobre um ponto, a doutrina, que procura o bem e a verdade em toda a parte em que se encontrem, os assimilará, de sorte que em vez de ser absorvida, será ela que absorve.

Se alguns de seus membros vierem a se separar dela, é que crêem poder fazer melhor; se realmente fizerem melhor, ela os imitará; se fizerem maior bem, ela se esforçará por fazer outro tanto ou mais, se possível; se fizerem mais mal, ela os deixará fazer, certa de que, mais cedo ou mais tarde, o bem triunfará sobre o mal e o verdadeiro sobre o falso. Eis a única luta que ela travará.

Acrescentemos que a tolerância, conseqüência da caridade, que é a base da moral espírita, ;he faz um dever respeitar todas as crenças. Querendo ser aceita livremente, por convicção e não por constrangimento, proclamando a liberdade de consciência como um direito natural imprescritível, diz ela: "Se eu tiver razão, os outros acabarão pensando como eu; mas se estiver errado, acabarei por pensar como os outros. Em virtude destes princípios, não atirando a pedra em ninguém, ela não dará qualquer pretexto a represálias, e deixará aos dissidentes toda a responsabilidade de suas palavras e atos.

O programa da doutrina não será, pois, invariável senão nos princípios passados ao estado de verdades constatadas; quanto aos outros, ela não os admitirá, como sempre fez, senão a título de hipóteses, até a confirmação. Se lhes for demonstrado que está errada num ponto, ela se modificará nesse ponto.

A verdade absoluta é eterna e, por isto mesmo, invariável; mas, quem se pode gabar de a possuir toda inteira? No estado de imperfeição dos nossos conhecimentos, o que hoje nos parece falso, amanhã pode ser reconhecido verdadeiro, por força da descoberta de novas leis; assim é na ordem moral como na ordem física.

É contra esta eventualidade que a doutrina jamais deve achar-se desprevenida. O princípio progressivo, que ela inscreve no seu código, será, como dissemos, a salvaguarda de sua perpetuidade, e sua unidade será mantida precisamente porque não repousa sobre o princípio da imobilidade. A imobilidade, em vez de ser uma força, torna-se uma causa de fraqueza e de ruína para quem não siga o movimento geral; ela rompe a unidade, porque os que querem ir avante se separam dos que se obstinam em ficar atrás. Mas, acompanhando o movimento progressivo, é preciso fazê-lo com prudência e guardar-se de baixar a cabeça aos sonhos das utopias e dos sistemas. É preciso fazê-lo a tempo, nem muito cedo, nem muito tarde e com conhecimento de causa.

Compreende-se que uma doutrina assente em tais bases deve ser realmente forte; ela desafia toda concorrência e neutraliza as pretensões de seus competidores. É para este ponto que os nosso esforços tendem a conduzir a doutrina espírita.

Aliás a experiência já justificou esta previsão. Tendo a doutrina marchado nesta via desde a sua origem, avançou constantemente, mas sem precipitação, olhando sempre se o terreno onde o pé é solido e medindo os passos pelo estado da opinião. Fez como o navegador que não marcha senão com a sonda na mãos e consultando os ventos.

IV O Chefe do Espiritismo

Mas quem será encarregado de manter o Espiritismo nesta via? Quem terá mesmo a força? Quem terá o lazer e a perseverança de se afazer ao trabalho incessante que exige semelhante tarefa? Se o Espiritismo está entregue a si mesmo, sem guia, não é para temer que se desvie de sua rota?

Que a malevolência, a que por muito tempo ainda estará exposto, não se esforce por lhe desnaturar o espírito? Com efeito, aqui está uma questão vital, e cuja solução é do maior interesse para o futuro da doutrina.

A necessidade de uma direção central superior, guarda vigilante da unidade progressiva e dos interesses gerais da doutrina, é de tal modo evidente, que já se inquietam por não ver ainda um condutor surgir no horizonte.

Compreende-se que, sem uma autoridade moral, capaz de centralizar os trabalhos, os estudos e as observações, de dar o impulso, de estimular o zelo, de defender o fraco, de amparar as coragens vacilantes, de ajudar com os conselhos da experiência, de fixar a opinião sobre os pontos incertos, o Espiritismo correria o risco de marchar à deriva. Não só essa direção é necessária, mas é preciso que esteja nas de força e de estabilidade suficientes para enfrentar as tempestades.

Os que não querem qualquer autoridade não compreendem os verdadeiros interesses da doutrina; se alguns pensam podem dispensar qualquer direção, na maior parte, os que não crêem em sua infalibilidade e não tem uma confiança absoluta em suas próprias luzes, sentem necessidade de um apoio, um guia, quando mais não fosse para os ajudar a marchar com mais firmeza e segurança. (Vide Revista de abril de 1866: O Espiritismo independente).

Estabelecida a necessidade de uma direção, de quem o chefe receberia os poderes? Seria aclamado pela universalidade dos adeptos disseminados no mundo inteiro? É uma coisa impraticável.

Se ele se impuser por sua autoridade privada, seria aceito por uns, rejeitado por outros e vinte pretendentes podem surgir erguendo bandeira contra bandeira; seria ao mesmo tempo o despotismo e a anarquia. Um tal ato seria o caso de um ambicioso, e nada seria menos próprio que um ambicioso, por isto mesmo orgulhoso, a dirigir uma doutrina baseada na abnegação, no devotamento, do desinteresse e na humildade; colocado fora do princípio fundamental da doutrina, não poderia senão falsear o seu espírito.

É o que teria lugar inevitavelmente, se ele não tivesse previamente tomado medidas eficazes para evitar esse inconveniente.

Admitamos, entretanto, que um homem reuna todas as qualidades requeridas para o desempenho de seu mandado, e que chegue à direção superior por uma via qualquer: os homens se seguem e não se assemelham; depois de um bom pode vir um mau; com o indivíduo pode ganhar o Espírito da direção; sem maus desígnios, pode ter vistas mais ou menos justas; se quiser fazer prevalecer suas idéias pessoais, pode fazer desviar a doutrina, suscitar divisões, e as mesmas dificuldades renovar-se-ão a cada mudança.

É preciso não perder de vista que o Espiritismo ainda não está na plenitude de sua força; do ponto de vista da organização, é uma criança que apenas começa a andar; importa, pois, sobretudo no começo, premuni-lo contra as dificuldades do caminho.

Mas, perguntarão, um dos messias anunciados, que devem tomar parte na regeneração, não estará a testa do Espiritismo?

É provável; mas como eles não trazem na testa uma marca para se fazerem reconhecer, como só se afirmarão por seus atos, e, na maioria, não serão reconhecidos senão depois de sua morte, conforme o que tiverem feito durante a vida; como, aliás, não haverá messias para a perpetuidade, é preciso prever todas as eventualidades.

Sabe-se que sua missão será múltipla; que os haverá em todos os degraus da escada e nos diversos ramos da economia social, onde cada um exercerá sua influência em proveito das idéias novas, conforme a especialidade de sua posição; todos trabalharão, pois, para e estabelecimento da doutrina, quer de uma parte, quer de outra, uns como chefes de Estado, outros como legistas, outros como magistrados, cientistas, literatos, oradores, industriais, etc.; cada um fará suas provas na sua parte, desde o proletário até o soberano, sem que nada mais que suas obras o distingam do comum dos homens.

Se um deles deve tomar parte na direção administrativa do Espiritismo, é provável que providencialmente seja colocado em posição de aí chegar pelos meios legais que forem adotados; circunstâncias aparentemente fortuitas, para lá o conduzirão, sem desígnio premeditado de sua parte, sem que tenha consciência da missão (Revista: Os messias do Espiritismo, fevereiro e março de 1868).

Em semelhante caso o pior de todos os chefes seria aquele que se desse por eleito de Deus. Como não é racional admitir que Deus confie tais missões a ambiciosos ou orgulhosos, as virtudes características de um verdadeiro messias devem ser, antes de tudo, a simplicidade, a modéstia, numa palavra, o mais completo desinteresse material e moral.

Ora, a só pretensão de ser messias seria a negação dessas qualidades essenciais; ela provaria naquele que se prevalecesse de semelhante título, ou uma toda presunção, se fosse de boa-fé, ou uma insigne impostura. Não faltarão intrigantes, pseudo-espíritas, que se queiram elevar pelo orgulho, pela ambição ou pela cupidez; outros que se pretenderão supostas revelações, com a ajuda das quais procurarão por em relevo e fascinar as imaginações muito crédulas.

É preciso, também, prever que, sob falsas aparências, indivíduos poderiam tentar apoderar-se do leme com a segunda intenção de afundar o barco, desviando-o de sua rota. Não naufragará, mas poderá experimentar atrasos desagradáveis, que é preciso evitar. Eis ai', em contestação, os maiores escolhos de que o Espiritismo se deve guardar; quanto mais consistência ele toma, mais embustes lhe criarão os seus adversários.

É, pois, dever de todos os Espíritas sinceros desviar as manobras da intriga que podem ser urdidas nos menores, como nos maiores centros. Deverão logo de saída repudiar do modo mais absoluto, quem quer que julgasse, por si mesmo, um messias, quer como chefe do Espiritismo, quer como simples apóstolo da doutrina.

Conhece-se a árvore pelo fruto; esperai, pois, que ela tenha dado frutos, antes de julgar se é boa, e olhai ainda se os frutos não estão bichados (Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. XXXI, no. 9: Caracteres do verdadeiro profeta).

Alguém com quem conversávamos a esse respeito, propunha o seguinte expediente: fazer designar os candidatos pelos próprios Espíritos em cada grupo ou sociedade espírita. Além deste meio não obviar todos os inconvenientes, haveria outros especiais nesse modo de proceder, que a experiência já demonstrou e que seria supérfluo aqui os recordar.

Não se deve perder de vista que a missão dos Espíritos é instruir-nos, melhorar-nos, mas não se substituírem à iniciativa do nosso livre-arbítrio. Eles nos sugerem pensamentos, ajudam-nos com seus conselhos, sobretudo no que toca as questões morais, mas deixam ao nosso julgamento o cuidado da execução das coisas materiais, que não tem missão de nos ocupar.

Em seu mundo eles tem atribuições que não são as daqui debaixo; pedir-lhes o que está fora de suas atribuições, é expor-se as trapaças dos Espíritos levianos. Que os homens se contentem com serem assistidos e protegidos por bons Espíritos, mas que não descarreguem sobre estes a responsabilidade que incumbe ao papel de encarnado.

Alias esse meio suscitaria mais embaraços do que se pensa, pela dificuldade de fazer toso os grupos participarem dessa eleição; seria uma complicação nas engrenagens, e as engrenagens são tanto menos suscetíveis de se desorganizar, quanto mais simplificadas.

O problema é, pois, constituir uma direção central, em condições de força e d estabilidade que aponham ao abrigo das flutuações, que respondam a todas as necessidades da causa e oponham uma barreira absoluta às manobras da intriga e da ambição. Tal é o objetivo do plano, do qual vamos dar um rápido esboço.

V Comitê Central

Durante o período de elaboração, a direção do Espiritismo teve de ser individual; era necessário que todos os elementos constitutivos da doutrina, saídos do estado de embriões de uma multidão de focos, chegassem a um centro comum, para aí serem controlados e comprovados, e que um só pensamento presidisse à sua coordenação, para estabelecer a unidade no conjunto e a harmonia de todas as partes.

Se tivesse sido de outro modo, a doutrina ter-se-ia assemelhado a esses edifícios lúbridos, construídos por vários arquitetos, ou a um mecanismo cujas engrenagens não se ajustam umas nas outras com precisão.

Nós o dissemos, porque é uma incontestável verdade, hoje claramente demonstrada: a doutrina não podia sair, em todas as peças, de um único centro, como toda a ciência astronômica de um só observatório; e todo centro que tivesse tentado constituí-la só como as suas observações, teria feito algo de incompleto e ter-se-ia achado, numa infinidade de pontos, em contradição com os outros. Se mil centros tivessem querido fazer a sua doutrina, não teria havido duas iguais em todos os pontos. Se tivesse estado de acordo quanto ao fundo, inevitavelmente teriam diferido quanto à forma.

Ora, como há muita gente que vê a forma em vez do fundo, teria havido tantas seitas quantas formas diferentes. A unidade não podia sair senão do conjunto e da comparação de todos os resultados parciais. Eis porque a concentração dos trabalhos é necessária (Gênese, Cap. I, Caracteres da revelação Espírita, nn. 51 e seguintes).

Mas o que era uma vantagem para um tempo, mais tarde tornar-se-á um inconveniente. Hoje que o trabalho de elaboração está terminado, ao que concerne as questões fundamentais; que estão estabelecidos os princípios gerais da ciência, a direção, de individual que teve de ser no começo, deve tornar-se coletiva.

Inicialmente porque vem um momento em que seu peso excede as forças de um homem; e, em segundo lugar, porque há mais garantia para a manutenção da unidade numa reunião de indivíduos, cada um dos quais tem apenas a sua voz no capítulo, e nada podem sem o concurso uns dos outros, do que num só, que pode abusar de sua autoridade e querer fazer predominarem suas idéias pessoais.

Em lugar de um chefe único, a direção será entregue a um comitê central ou conselho superior permanente - o nome pouco importa - cuja organização e atribuições serão definidos de maneira a nada deixar ao arbítrio. Esse comitê será composto de doze membros titulares, no máximo, os quais deverão, reunir certas condições requeridas, e um número igual de conselheiros.

Conforme as necessidades, poderá ser secundado por membros auxiliares ativos. Completar-se-á por si mesmo, segundo as regras igualmente determinadas, de natureza a evitar todo favoritismo, à medida das vagas por extinções ou outras causas. Uma disposição especial, por sua vez, durante um ano, e o que desempenhar esta função será designado por sorteio.

A autoridade do presidente é puramente administrativa; ele dirige as deliberações do comitê, superintende a execução dos trabalhos e expedição dos negócios. Mas, fora das atribuições que lhe são conferidas pelos estatutos constitutivos, não pode tomar qualquer decisão sem o concurso do comitê. Portanto, impossíveis os abusos, o alimento de ambições, nada de pretextos para intrigas ou ciúmes, nada de supremacia chocante.

O comitê, ou conselho superior, será, pois, a cabeça, o verdadeiro chefe do Espiritismo, chefe coletivo, nada podendo sem o assentimento da maioria e, em certos casos, sem o de um congresso ou assembléia geral. Suficientemente numeroso para se esclarecer pela discussão, não o será bastante para que aí haja confusão.

Os congressos serão constituídos por delegados das sociedades particulares, regularmente constituídas, e colocadas sob o patrocínio do comitê por sua adesão e pela conformidade de seus princípios.

Para o público dos adeptos, a aprovação ou a desaprovação, o consentimento ou a recusa, as decisões, numa palavra, de um corpo constituído, representando uma opinião coletiva, terão forçosamente uma autoridade que jamais teriam se emanasse de um só indivíduo, que não representa senão uma opinião pessoal. Muitas vezes se rejeita a opinião de um só, julgão humilhado em se submeter a ela, quando se defere sem dificuldade a de muitos.

É bem entendido que aqui se trata de uma autoridade moral, no que concerne a interpretação e a aplicação dos princípios da doutrina, e não de um poder disciplinar qualquer. Esta autoridade será, em matéria de Espiritismo, o que é a de uma academia em matéria de ciência.

Para o público estranho, um corpo constituído tem mais ascendente e preponderância; contra os adversários, sobretudo, apresenta uma força de resistência e possui meios de ação que o indivíduo não poderia ter; luta infinitamente com mais vantagem. Uma individualidade é atacada e quebrada; não se dá o mesmo com um ser coletivo.

Num ser coletivo há igualmente uma garantia de estabilidade que não existe quando tudo repousa numa única cabeça; se o indivíduo for impedido por uma causa qualquer, tudo pode ser entravado. Ao contrário, um ser coletivo se perpetua incessantemente; se perder um ou vários de seus membros nada periclita.

Dir-se-á que a dificuldade será reunir, de maneira permanente, doze pessoas que estejam de acordo.

O essencial é que estejam de acordo quanto aos pontos fundamentais; ora, isto seria uma condição absoluta para a admissão, como a de todos os detalhes, pouco importa sua divergência, pois é a opinião da maioria que prevalece. Aquele cuja maneira de ver for justa, não faltarão boas razões para a justificar.

Se um deles, contrariado por não poder fazer que suas idéias sejam admitidas, se retirasse, nem por isso as coisas deixariam de seguir o seu curso e não haveria lugar para o lamentar, pois ele daria prova de uma susceptibilidade orgulhosa pouco espírita, e que poderia tornar-se uma causa de perturbação.

A causa mais comum de divisão entre co-interessados é o conflito de interesses e a possibilidade de um suplantar outro em seu proveito. Esta causa não tem a menor razão de ser, desde que o prejuízo de um não pode aproveitar aos outros, que são solidários e não podem senão perder, em vez de ganhar, pela desunião. Isto é uma questão de detalhe, prevista na organização.

Admitamos que no número se ache um falso irmão, um traidor, ganho pelos inimigos da causa: que poderia ele, se não tem senão sua voz nas decisões? Suponhamos que, por impossível, o comitê inteiro entre no mau caminho: os congressos aí estarão para por as coisas em ordem.

O controle dos atos da administração estará nos congressos, que poderão decretar a censura ou uma acusação contra o comitê central, por causa da infração de seu mandato, do desvio dos princípios reconhecidos, ou das medidas prejudiciais à doutrina. É por isto que ele os referirá aos congressos, nas circunstâncias em que julgar que a sua responsabilidade poderia ser comprometida de maneira grave.

Se, pois, os congressos são um freio para o comitê, este adquire uma nova força em sua aprovação. É assim que esse chefe coletivo levanta em definitiva a opinião geral e não pode, sem perigo para si mesmo, afastar-se do reto caminho.

Quando o comitê for organizado, dele faremos parte a título de simples membro, tendo nossa parte de colaboração, sem reivindicar para nós nem supremacia, nem título, nem qualquer privilégio.

As atribuições gerais do comitê serão anexados, como dependências locais:

1º - Uma biblioteca onde estarão reunidas todas as obras que interessam o Espiritismo, e que poderão ser consultadas no local ou dadas como leitura;

2º - Um museu, onde serão reunidas as primeiras obras de arte espírita, os trabalhos mediúnicos mais notáveis, os retratos dos adeptos que bem tiverem merecido da Causa por seu devotamento, os dos homens que o Espiritismo honra, posto que estranhos à doutrina, como benfeitores da humanidade, grandes gênios missionários do progresso, etc. (4)

3º - Um dispensário destinado às consultas médicas gratuitas e ao tratamento de certas afecções, sob a direção de um médico patenteado;

4º - Uma caixa de socorro e previd6encia, em condições práticas;

5º - Uma casa de retiro;

6º - Uma sociedade de adeptos, tendo sessões regulares.

VI Obras fundamentais da Doutrina

Muitas pessoas lamentam que as obras fundamentais da doutrina sejam de um preço tão alto para grande número de leitores, e pensam, com razão, que se fosse feitas edições populares e baixo custo, estariam muito mais espalhadas, com o que ganharia a doutrina.

Estamos completamente de acordo; mas as condições em que são editadas não permitem que sejam de outro modo, no estado atual das coisas. Esperamos chegar um dia a esse resultado, com o auxílio de uma nova combinação que se ligue ao plano geral de organização. Mas essa operação não pode ser realizada senão empreendida em vasta escala.

De nossa parte, exigiria capitais que não possuímos e cuidados materiais que os nossos trabalhos, que reclamam todas as nossas meditações, não nos permitem dar. Assim, a parte comercial propriamente dita foi negligenciada ou, melhor dito, sacrificada ao estabelecimento da parte doutrinária. O que importava, antes de tudo, era que as obras fossem feitas e assentadas as bases da doutrina.

Quando a doutrina for organizada pela constituição do comitê central, nossas obras tornar-se-ão propriedade do Espiritismo na pessoa desse mesmo comitê, que terá a sua gerência e dará os necessários cuidados à sua publicação por meios mais próprios para as popularizar. Deverá igualmente ocupar-se de sua tradução nas principais línguas estrangeiras.

A Revista foi, até hoje, e não podia ser senão uma obra pessoal, visto faz parte de nossas obras doutrinárias, servindo aos anais do Espiritismo. É aí, que todos os princípios novos são elaborados e postos em estudo. Era, pois, necessário que conservasse o seu caráter individual, para a fundação da unidade.

Muitas vezes temos sido solicitado para fazer que ela aparecesse em intervalos menores. Por mais lisonjeiro que nos fosse tal desejo, não pudemos aceder. Primeiro porque o tempo material não nos permitiria esta sobrecarga de trabalho; e em segundo lugar, porque ela não devia perder o seu caráter essencial, que não é o de um jornal propriamente dito.

Hoje que a nossa obra pessoal se aproxima de seu termo, as necessidades não são mais as mesmas; a Revista tornar-se-á, como as nossas obras feitas e por fazer, propriedade coletiva do comitê, que tomará a sua direção, para maior utilidade do Espiritismo, sem que, por isto, renunciemos a lhe dar a nossa colaboração.

Para completar a obra doutrinária, resta-nos publicar várias obras, que não são em sua parte menos difícil, nem a menos penosa. Posto possuamos todos os seus elementos e o programam esteja traçado até o último capítulo, poderíamos lhes dar cuidados mais assíduos e as ativar se, pela instituição do comitê central, estivéssemos libertos de detalhes, que absorvem grande parte do nosso tempo.

VII Atribuições do Comitê

As principais atribuições do comitê central serão:

1º - O cuidado dos interesses da doutrina e sua propagação; a manutenção de sua unidade pela conservação da integridade dos princípios reconhecidos; o desenvolvimento de suas conseqüências;

2º - O estudo dos princípios novos, susceptíveis de entrar no corpo da doutrina;

3º - A concentração de todos os documentos e informações que possam interessar o Espiritismo;

4º - A correspondência;

5º - A manutenção, a consolidação e a extensão dos laços de fraternidade entre os adeptos e as sociedades particulares dos vários países;

6º - A direção da revista, que será o jornal oficial do Espiritismo, e à qual juntar-se uma outra publicação periódica;

7º - O exame e a apreciação das obras, artigos de jornais e todos os escritos que interessam a doutrina. A refutação dos ataques, se for o caso;

8º - A publicação das obras fundamentais da doutrina, nas mais próprias condições à sua vulgarização. A confecção e a publicação das que nos derem o plano e que não teríamos tempo de fazer em nossa vida. Os encorajamentos dados às publicações que puderem ser úteis à causa;

9º - A fundação e a conservação da biblioteca, dos arquivos e do museu;

10º - A administração da caixa de socorro, do dispensário e da casa de retiro;

11º - A administração dos negócios materiais;

12º - A direção das sessões da sociedade;

13º - O ensino oral;

14º - As visitas e instruções às reuniões e sociedade particulares que se colocarem sob seu patrocínio;

15º - A convocação dos congressos e assembléias gerias.

Essas atribuições serão repartidas entre os diversos membros do comitê, segundo a especialidade de cada um, os quais, se necessário, serão assistidos por um número suficiente de membros auxiliares ou por simples empregados.

Em conseqüência, entre os membros do comitê haverá:

Um secretário geral para a correspondência e atas das sessões do comitê;

Um redator chefe para a revista e as outras publicações;

Um bibliotecário arquivista, além disso encarregado do exame e das críticas das obras e artigos de jornais;

Um diretor da caixa de socorro, além disso encarregado da direção do dispensário, das visitas aos doentes e necessitados, e de tudo o que se refere à beneficência. Será secundado por um comitê de beneficência, escolhido no seio da sociedade, e formado de pessoas caridosas de boa vontade;

Um administrador contador, encarregado dos negócios e interesses materiais;

Um diretor especial para os negócios concernentes as publicações;

Oradores para o ensino oral, além disso encarregados de visitar as sociedades dos departamentos e aí dar instruções. Poderão ser tomados entre os membros auxiliares e os adeptos de boa vontade, que para tanto receberão uma autorização especial.

Seja qual for a extensão dos negócios e do pessoal administrativo, o comitê será sempre limitado ao mesmo número de membros titulares.

Até agora tivemos de nos bastar sozinhos a este programa. Assim, algumas de suas partes foram negligenciados ou apenas puderam ser esboçadas, e as que são mais especialmente da nossa competência, tiveram que sofrer inevitáveis atrasos, pela necessidade de nos ocupar de tantas coisas, quando o tempo e a força tem limites e uma só absorveria o tempo de um homem.

VIII Vias e meios

É sem dúvida desagradável ser obrigado a entrar em considerações materiais para atingir um objetivo todo espiritual; mas é preciso observar que a espiritualidade mesma da obra se prende à questão da humanidade terrena e de seu bem-estar; que não se trata mais apenas da emissão de algumas idéias filosóficas, mas de fundar alguma coisa de positivo e durável, para a extensão e a consolidação da doutrina, à qual é preciso fazer produzir os frutos que é susceptível de dar.

Figurar-se que ainda estamos nos tempos em que alguns apóstolos podiam por a caminho com o bastão de viagem, sem preocupação de hospedagem e do pão quotidiano, seria uma ilusão logo desfeita por uma amarga decepção. Para fazer algo de sério, há que se submeter às necessidades impostas pelos costumes da época em que se vive. Essas necessidades são muito outras que as dos tempos patriarcais; o próprio interesse do Espiritismo exige, pois, que se calculem os meios de ação para não ser detido em caminho. Calculemos, pois, já que estamos num século em que é preciso contar.

As atribuições do comitê central serão bastante numerosas, como se vê, por necessitar uma verdadeira administração. Tendo cada membro funções ativas e assíduas, se não se tomassem senão homens de boa vontade, os trabalhos poderiam sofrer com isto, porque ninguém teria direito de censurar os negligentes.

Para a regularidade dos trabalhos e a expedição dos negócios, é necessário ter homens sobre cuja assiduidade se possa contar, e cujas funções não sejam simples atos de complacência. Quanto mais independência tivessem por seus recursos pessoais, menos ficariam adstritos a ocupações assíduas; se não as tiverem, poderão dar o seu tempo. É preciso, pois, que sejam retribuídos, assim como o pessoal administrativo; com isso a doutrina ganhará em força, estabilidade, pontualidade, ao mesmo tempo que será um meio de prestar serviços a pessoas que dele teriam necessidade.

Um ponto essencial na economia de toda administração previdente é que sua existência não repousa sobre produtos eventuais, que podem faltar, mas sobre recursos fixos, regulares, de maneira que sua marcha, aconteça o que acontecer, não possa ser entravada.

É, pois, necessário que as pessoas chamadas a dar o seu concurso não possam conceber qualquer inquietação pelo futuro. Ora, a experiência demonstra que se devem considerar como aleatórios os recursos que não repassem senão no produto de cotizações, sempre facultativas, sejam quais forem os compromissos assumidos, e de uma cobertura muitas vezes difícil.

Assentar as despesas permanentes e regulares em recursos eventuais, seria uma falta de previdência, que um dia se poderia lamentar. Sem dúvida as conseqüências menos graves quando se trata de fundações temporárias, que duram o que podem. Mas aqui é uma questão do futuro. A sorte de uma administração como esta não pode estar subordinada às chamas de um negócio comercial; deve ser, desde o começo, senão tão florescente, ao menos tão estável quanto o será daqui a um século. Quanto mais sólida for a sua base, menos exposta estará aos golpes da intriga.

Em semelhante caso a mais vulgar prudência quer que se capitalizem os recursos, de maneira inalienável, à medida que chegam, a fim de constituir um rendimento perpétuo, ao abrigo de todas as eventualidades. Regulando suas despesas pelo rendimento, a existência da administração não pode ser comprometida em caso algum pois sempre terá meios para funcionar.

Começando, ela pode ser organizada numa escala menor; os membros do comitê provisoriamente podem limitar-se a cinco ou seis, o pessoal e os gastos administrativos reduzidos à sua expressão mais simples, salvo para proporcionar o desenvolvimento pelo crescimento dos recursos e das necessidades da causa, mas ainda que falte o necessário.

Pessoalmente, e posto que parte ativa do comitê, não seremos pesado ao orçamento, nem por emolumentos, nem por indenização de viagens, nem por uma causa qualquer; se jamais pedimos algo a ninguém para nós, ainda menos o faríamos nesta circunstância; nosso tempo, nossa vida, todas as nossas forças físicas e intelectuais pertencem à doutrina. Declaramos, pois, formalmente, que nenhuma parte dos recursos de que disporá o comitê será distraída em nosso proveito.

Ao contrário, a ele trazemos nossa quota-parte:

1º - pelo abandono do lucro de nossas obras, feitas e por fazer;

2º - A entrega de valores móveis e imóveis;

Assim, fazemos votos para que a realização do nosso plano, no interesse da doutrina e não para aí nos criarmos uma posição da qual não necessitamos. Foi para preparar as vias desta instalação que até hoje consagramos o produto de nossos trabalhos, como dissemos acima. Se nossos meios pessoais não nos permitem fazer mais, pelo menos teremos a satisfação de nela haver posto a primeira pedra.

Suponhamos então que, por uma via qualquer, o comitê central, num dado tempo, esteja posto em condições de funcionar, o que supõe um rendimento de 25 a 30 mil francos, restringindo-se, no começo, os recursos de toda natureza de que disponha, em capitais e produtos eventuais constituirão a Caixa Geral do Espiritismo, que será objeto de uma rigorosa contabilidade.

Sendo reguladas as despesas obrigatórias, o excedente da renda aumentará o fundo comum; é proporcionalmente aos recursos desse fundo que o comitê proverá às diversas despesas úteis aos desenvolvimento da doutrina, sem que jamais possa faze-lo em seu proveito pessoal, nem uma fonte de especulação para qualquer de seus membros. O emprego dos fundos e a contabilidade serão, aliás, submetidos à vivificação por comissários especiais, para esse efeito delegados pelos congressos ou assembléias gerais.

Um dos primeiros cuidados do comitê será o de se ocupar das publicações, desde que haja possibilidade, sem esperar poder faze-lo com auxílio da renda; os fundos afetados para esse uso não serão, na realidade, senão um adiantamento, pois reverterão pela venda das obras, cujo produto voltará ao fundo comum. É um negócio de administração.

Para dar a essa instituição uma existência legal, ao abrigo de qualquer contestação, dar-lhe, além disso o direito de adquirir, receber e possuir, ela será constituída, se for julgado necessário, por ato autêntico, sob forma de sociedade comercial anônima, por noventa e nove anos, indefinidamente prorrogável, com todas as estipulações necessárias para que jamais possa afastar-se do seu objetivo, e que os fundos não possam ser desviados de seu destino.

Sem aqui entrar em detalhes que seriam supérfluos e prematuros, devemos,, entretanto, dizer algumas palavras sobre duas instituições acessórias do comitê, a fim de que não se enganem quanto ao sentido que a elas ligamos; queremos falar da caixa de socorro e da casa de retiro.

O estabelecimento de uma caixa geral de socorros é uma coisa impraticável, e que apresentaria sérios inconvenientes, como demonstramos num artigo especial (Revista de julho de 1866). O comitê não pode, pois, empenhar-se numa via, que em breve seria forçado a abandonar, nem empreender qualquer coisa que não esteja certo de poder realizar. Deve ser positivo e não embalar-se em ilusões quiméricas; é o meio de marchar muito tempo e com segurança. Para isto deve, em tudo, ficar nos limites do possível.

Essa caixa de socorro não pode, nem deve ser senão uma instituição local, de ação circunscrita, cuja prudente organização poderá servir de modelo a outras do mesmo gênero, que as sociedades particulares poderiam criar. É por sua multiplicidade que poderiam prestar serviços eficazes, e não centralizando os meios de ação.

Ela será alimentada: 1º - pela porção afetada para este destino sobre a renda da Caixa Geral do Espiritismo; 2º - pelos donativos especiais que a elas forem feitos. Ela capitalizará as somas recebidas, de maneira a constituir uma renda; é desta renda que dará recursos temporários ou vitalícios e cumprirá as obrigações de seu mandato, que serão estipuladas em seu regulamento constitutivo.

O projeto de uma casa de retiro, na acepção completo do vocábulo, mas pode ser realizada de início, em razão dos capitais que exigiria semelhante fundação, e, além disso, porque é preciso deixar à fundação o tempo necessário de se fixar e marchar com regularidade, antes de pensar em complicar suas atribuições por empreendimentos nos quais poderia fracassar.

Abraçar muitas coisas antes de se ter assegurado meios de execução, seria uma imprudência. Compreender-se-á facilmente se refletir em todos os detalhes que comportam estabelecimentos desse g6enero. Sem dúvida é bom ter boas intenções, mas antes de tudo é preciso poder realizá-las.

IX Conclusão

Tais são as bases principais da organização que nos propomos dar ao Espiritismo, se as circunstâncias no-lo permitirem. Tivemos que desenvolver os motivos um pouco longamente, a fim de dar a conhecer o seu espírito. Os detalhes serão objeto de uma regulamentação minuciosa, na qual todos os casos serão previstos de maneira a levar em consideração todas as dificuldades.

Conseqüente com os princípios de tolerância e de respeito a todas as opiniões, que o Espiritismo professa, não pretendemos impor esta organização a ninguém, nem constranger quem quer que seja a se submeter a ela. Nosso objetivo é estabelecer um primeiro laço entre os Espíritas, que o desejam desde muito tempo e se lastimam de seu isolamento.

Ora, este laço, sem o qual o Espiritismo, ficando no estado de opinião individual, sem coesão, não pode existir senão com a condição de se religar a um centro por uma comunhão de vistas e de princípios. Esse centro não é uma individualidade, mas um foco de atividade coletiva, agindo no interesse geral e na qual a autoridade pessoal se apaga.

Se ele não existisse, qual teria sido o ponto de ligação dos Espíritas espalhados em diversos países? Não podendo comunicar suas idéias, suas impressões, suas observações a todos os outros centros particulares, eles também disseminados, e muitas vezes sem consistência, teriam ficado isolados, e a difusão da doutrina teria sofrido com isto. Era, pois, necessário um ponto aonde todos chegassem, e de onde tudo pudesse se irradiar.

O desenvolvimento das idéias espíritas, longe de tornar esse centro inútil, faria melhor sentir a sua necessidade, porque a necessidade de aproximação e de formação de um feixe será tanto maior quanto mais considerável for o número de adeptos.

Mas qual será a extensão do círculo de atividades desse centro? É destinado a reger o mundo e a tornar-se o árbitro universal da verdade?

Se tivesse essa pretensão, seria compreender mal o espírito do Espiritismo que, por isso mesmo que proclama os princípios do livre exame e da liberdade de consciência, repudia o pensamento de se erigir em autocracia; desde o começo entraria numa via fatal.

O Espiritismo tem princípios que, em razão de se fundarem nas leis da natureza, e não em abstrações metafísicas, tendem a tornar-se, e certamente tornar-se-ão um dia, os da universalidade dos homens. Todos os aceitarão, porque serão verdades palpáveis e demonstradas, como aceitaram a teoria do movimento da terra; mas pretender que o Espiritismo em toda a parte seja organizado da mesma maneira; que os Espíritas do mundo inteiro sejam sujeitos a um regime uniforme, a uma mesma maneira de proceder; que devam esperar a luz de um ponto fixo, para o qual deverão fixar o olhar, seria uma utopia tão absurda quanto pretender que todos os povos da terra um dia não formem senão uma nação, governada por um único chefe, regida pelo mesmo código de leis e sujeita aos mesmos usos. Se há leis gerais que podem ser comuns a todos os povos, essas leis serão sempre, nos detalhes da aplicação e da forma, apropriadas aos costumes, aos caracteres, ao clima de cada uma.

Assim será com o Espiritismo organizado. Os Espíritas do mundo inteiro terão princípios comuns, que os ligarão à grande família pelo laço sagrado da fraternidade, mas cuja aplicação poderá variar conforme as regiões, sem que, por isto, seja rompida a unidade fundamental, sem formar seitas dissidentes que se atirem a pedra e o anátema, o que seria anti-espírita, de saída.

Poderão formar-se e formar-se-ão inevitavelmente, centros gerais em diversos países, sem outro laço além da comunidade de crença e a solidariedade moral, sem subordinação de um ao outro, sem que o da França, por exemplo, tenha a pretensão de se impor aos Espíritas americanos e reciprocamente.

A comparação das observações, que citamos acima, é perfeitamente justa. Há observações em diferentes pontos do globo; todos, seja qual for a nação a que pertençam, estão baseados nos princípios gerais reconhecidos da astronomia, o que, por isso, não os torna tributários uns dos outros; cada um reputa seus trabalhos como entende; comunicam-se as suas observações, e cada um põe em proveito da ciência as descobertas de seus confrades.

Será o mesmo com os centros gerais do Espiritismo; serão os observatórios do mundo invisível, que permutarão o que tiverem de bom e aplicável aos costumes das regiões onde estiverem estabelecidos; pois o seu objetivo é o bem da humanidade, e não a satisfação das ambições pessoais. O Espiritismo é uma questão de fundo; ligar-se à forma seria uma puerilidade indigna da natureza do assunto. Eis porque os centros diversos, que estiverem no verdadeiro espírito do Espiritismo, deverão estender-se a mão fraterna e se unir para combaterem seus inimigos comuns: a incredulidade e o fanatismo.

(1) Tratamos especialmente a questão das instituições espíritas num artigo da Revista de julho de 1866, ao qual remetemos para maiores esclarecimentos.

(2) Estas somas se elevam naquela época a 14.000 francos, cujo emprego, em proveito exclusivo da doutrina, está justificado pelas contas.

(3) Aos que perguntaram porque vendíamos os nossos livros em vez de os dar, respondemos que o faríamos, se tivéssemos encontrado impressor que no-los imprimisse de graça, um negociante que fornecesse o papel grátis, livreiros que não exigissem nenhuma comissão para os distribuir, uma administração dos correios que os transportasse por filantropia, etc. Esperando, como não temos milhões para cobrir esses encargos, somos obrigados a lhes dar um preço.

(4) O futuro museu já possui oito quadros de grandes dimensões, que só esperam um local conveniente, verdadeiras obras-primas de arte, especialmente executadas em vista do Espiritismo, por um artista de renome, que generosamente ofereceu à doutrina. É a inauguração da arte espírita, por um homem que reúne a fé sincera ao talento dos grandes mestres. Em tempo hábil daremos sua descrição detalhada.

Revista Espírita, dezembro de 1868